Trumparias


Pouco depois de tomar posse, Donald Trump aflorou a possibilidade de a ilha Terceira dever pertencer aos EUA, por usufruto campeão. A coisa passou e morreu na estupidez. Aparentemente.
No passado dia 7 de Abril, na sequência de um suposto ataque com armas químicas contra a cidade de Duma, na Síria, Trump ameaçou retaliar. Dia 10, estamos na marina de Praia da Vitória, que para quem não conhece esclareço que é por onde entra toda a aviação para aterrar nas Lajes, civil ou militar (porque as pistas são paralelas, mas não exactamente comuns), quando começamos a ouvir um som ensurdecedor de aviões. Olhamos para cima e vemos caças bombardeiros a entrar aos pares, com os respectivos caças de abastecimento, surpreendidos, porque são ultra-rápidos e tão barulhentos, que chegam a ser verdadeiramente assustadores, mesmo quando sabemos que não vão despejar uma bomba em cima de nós, quanto mais, imaginei eu, a sobrevoarem crianças em terreno de guerra. Depois, foi assim o dia todo. Após a segunda "leva", comentei com o Francisco que o Trump ia mesmo atacar a Síria. Ele achou que eu estava a ver coisas, porque não fazia sentido nenhum ele vir por este caminho. Ao fim do dia, começou a achar que, de facto, já era aviação militar a mais e, enfim, talvez eu tivesse razão, quando lhe disse que todos os ataques norte-americanos passam pelas Lajes. E assim foi, de facto. Estava certa.
Em Angra do Heroísmo, não se ouvem nem vêem os aviões, sejam civis ou militares, a não ser mesmo muito excepcionalmente. Mas em Praia da Vitória, que ganhou o nome de Vitória por ter lutado pelo Liberalismo, as coisas são diferentes. Ali, as pessoas vivem as Lajes desde que os norte-americanos aproveitaram a boleia dos ingleses, durante a II Guerra, para aqui se instalarem. 
Quero eu com tudo isto dizer que a Terceira tem muito que se lhe diga. E as Lajes, as dos norte-americanos, que se foram, mas não totalmente, são uma plataforma estratégica no meio do Atlântico. Hei-de falar mais sobre esta questão, que não é de somenos, porque por aqui foram donos e senhores os militares dos EUA durante demasiado tempo, com Portugal a fingir que não era nada connosco. Mas é! Os Açores não podem ser olhados apenas como o arquipélago que faz de Portugal um país com uma zona marítima imensa. Os Açores são muito mais do que isso. E a ilha Terceira, aquela para onde decidi vir viver, onde em tempos se localizou a capital do Império, onde as bravas gentes resistiram aos filipes, onde D. Pedro se sentiu em casa, tem também uma história surda que é importante deixar de ignorar.
Uma jovem britânica, um pouco confusa com todas as notícias distorcidas que lê no seu país Brexit, e crente na boa vontade dos norte-americanos, disse-me em Julho que a guerra nuclear estava iminente, porque os russos são uma ameaça e os EUA, aos quais a Grã-Bretanha deve muito, mesmo com o Trump, que tendo coisas más tem também coisas muito boas, iam ter de retaliar. Filha da Guerra Fria, disse-lhe que essa coisa da guerra nuclear não ia ser tão possível assim e que ela se acalmasse quanto aos russos, que o Muro já caiu antes dela nascer. 
Quando o Trump declarou, esta semana, que o acordo assinado por Gorbachov e Ronald Reagan, em 1987, estava anulado, pensei naquilo que me era inimaginável e de que a menina britânica me falara. Só que, ao contrário do que ela afirmara com convicção, o problema não são os russos, mas sim os EUA. Só que, na Inglaterra de 2018, como em muitas partes do mundo, "o perigo russo" continua a ser "o perigo vermelho", o que, se não revelasse uma ignorância tremenda até dava para rir. Mas não dá! 
A ignorância é amiga dos ditadores. Manter as pessoas acéfalas, permite a manipulação. Alimentar uns terrores, normalmente inexistentes, ajuda a desbravar o objectivo de quem não gosta da democracia e muito menos da liberdade. 
Espero, muito sinceramente, que a Amazónia continue a ser a Amazónia. Porque a Terra precisa de respirar. E espero, também, não ter escolhido uma ilha, pela qual nos apaixonamos facilmente, porque é bela e tem gentes com bravura, que se torne a plataforma do inferno do Mundo. 
Hoje não estou para brincadeiras, que o caso é mesmo muito sério. 
Guiomar Belo Marques©



Ilegítima De regresso ao blog, sinto-me como regressada à Ilha Lilás, como a filha ilegítima que sou, por natureza. Ilegítima nos sítios...